Aplicações práticas na estrutura de um Planejamento Estratégico – Parte II

Sensemaking

O termo Sensemaking foi cunhado por Karl Weick no livro Sensemaking in Organizations publicado em 1995. No livro, Weick diz logo no início que o livro não se tratava de um corpo de conhecimento, mas sim de um tema, uma conversa em andamento. Podemos concluir que o sensemaking está em constante evolução em seus conceitos.

Weick começa relatando a Síndrome da Criança Agredida, e afirma que este acontecimento é o sensemaking testado ao extremo. Ocorre quando as pessoas encontram um fato que é tão implausível que tem medo de reportar com receio de que se não acredite. O pensamento é: “isso não pode ser verdade”, ou “não acredito que isso realmente ocorreu” e portanto concluem que de fato não aconteceu.

A Síndrome da Criança Agredida consiste em padrões de ferimentos, usualmente na cabeça, braços, pernas e costelas em crianças, sendo que a história contada pelos pais em relação as lesões não são suficientes para explicar. Essas lesões só podem ser vistas por raios-X e por esse motivo os pais não relatam, não entendem a gravidade ou fingem ser um acidente. Isso explica o fato da medicina ter demorado para reconhecer este padrão.

Tá, mas o que isso tem a ver com sensemaking? Primeiro que as histórias dos pais e dos radiologistas não batem, não fazem sentido. São pistas discrepantes, algo que não se encaixa. O padrão das lesões e a própria síndrome demora a ser descoberta, pois os radiologistas mantêm contato social pouco frequente com pediatras e famílias de crianças. Nestes casos a lentidão da construção de uma inteligência social passiva é ocasionada pelos fatos ocultos e não relatados.

No contexto organizacional, a desconexão entre as equipes que tratam as crianças, médicos, assistentes sociais, pais e órgãos de proteção as crianças além do fato de que as lesões não serem visíveis ao olho humano, levam a demora do diagnóstico. Os resultados de raio-x são interpretados, mas não aponta para as agressões, ou seja, os dados são gerados, mas são dados sem significado.

Definição de Sensemaking

A tradução literal da palavra é fazer sentido. A intenção é estruturar o desconhecido. Seria basicamente usar estratégias para a aquisição, produção, síntese, manipulação e difusão de informações de maneira a dar significado, finalidade e direção à organização. O sensemaking precisa levar a ação.

Meryl Louis no livro vê o sensemaking como um processo de pensamento que usa relatos retrospectivos para explicar surpresas.

O ciclo inicia quando os indivíduos formam antecipações e suposições, inconscientes e conscientes, que servem como previsões sobre eventos futuros. Subsequentemente, os indivíduos experienciam eventos que podem ser discrepantes em relação às suas previsões.

Gioia descreve como uma interação recíproca de busca de informação, a indicação de significado e a ação.

Sakcman fala sobre mecanismos de criação de sentido que os membros da organização usam para atribuir significado a eventos, mecanismos que “incluem os padrões e regras para perceber, interpretar, acreditar e agir que normalmente são usados em um determinado cenário cultural.

Feldman fala sobre a criação de sentido como um processo interpretativo necessário para que os membros da organização compreendam e compartilhem entendimentos sobre tais características da organização como o que ela trata, o que faz bem e mal, quais são os problemas que enfrentam e como deve resolvê-los.

Para iniciar  um ciclo de sensemaking precisamos de dados. Dados as mais variadas fontes. Estes dados por si só vão dizer alguma coisa, mas estarão sem sentido. Os dados precisam ser combinados e colocados em uma linguagem compreensível ara evitar a ambiguidade. Seria organizar algo como organizar, informação e trazê-la para um campo mais simples, mais útil e que estimule a tomada de decisão.

Essa analise deve ser feita de forma sistêmica. Estamos buscando fazer sentido para a organização, e não para este ou aquele departamento. Não podemos levar 25 anos para identificar padrões e fazer as conexões como na Síndrome da Criança Agredida. Dados são essenciais, mas só o sensemaking consegue ir a fundo. Sair da complexidade dos dados, para a simplicidade dos fatos.

Na prática, os problemas não são apresentados como dados aos gerentes. Sem sensemaking podemos superestimar uma situação e atribuir certo grau de complexidade que não existe. Importante frisar que Sensemaking consiste claramente de uma atividade ou um processo, ao passo que interpretação pode ser um processo, mas é mais provável que descreva um produto. É comum ouvir que alguém fez “uma interpretação”. Mas raramente ouvimos que alguém fez “um sensemaking”. Um foco em sensemaking induz a mente a focar no processo, ao passo que isso é menos verdadeiro com a interpretação.

O ato de interpretar implica que algo está lá, um texto no mundo, esperando para ser descoberto ou aproximado. Entretanto, sensemaking consiste menos em descoberta do que em invenção. Sensemaking é construir, filtrar, estruturar, criar e compor aquilo que é subjetivo em alguma coisa mais tangível.

O John Maeda no As Leis da Simpliciade, livro que recomendo a leitura coloca que SIMPLICIDADE = SANIDADE. O John tem uma missão pessoal que também é o foco da sua pequisa: atingir a simplicidade na era digital. Em 2004 ele deu início ao MIT Simplicity Consortium cuja missão é definir o valor da simplicidade nas comunicações, na assistência médica e nos jogos.

Nas organizações, entender e reduzir a complexidade torna-se essencial. Não confrontamos algo complexo com mais complexidade. Precisamos separar o joio do trigo, simplicidade e complexidade necessitam uma da outra.

Processo 

No livro  The Customer-Driven Playbook escrito por Jessica Rich, Travis Lowdermilk eles descrevem um processo que utilizam para traçar estratégias para produtos. A definição deles para sensemaking é: um processo que garante que organizemos os dados que coletamos, identificando padrões e insights significativos, que depois são refinados em uma história que leva outros a ação.

O loop foi inicialmente apresentado em um artigo escrito por Peter Pirolli e Stuart Card, chamado The Sensemaking Process and Leverage Points for Analyst Technology as Identified Through Cognitive Task Analysis. No artigo, assim como no livro a sequência de passos é:

Fonte dos dados: sãos as diversas fontes de dados que você coleta que ajudam você a validar uma hipótese. Estatísticas de uso, fóruns de discussão, tickets de suporte e sistemas de gerenciamento de relacionamento com clientes (CRM) são ótimas fontes de dados.

Caixa de sapatos: aqui os autores fazem uma analogia com as caixas de sapatos usadas na época para organizar fotos, antes das fotos na nuvem e da fotografia digital. Existem muitas “caixas de sapatos” colaborativas online para armazenar esses tipos de coisas. Microsoft SharePoint, OneNote, Evernote, e Google Drive. São ferramentas que nos permite organizar as informações.

Pasta do arquivo: Novamente uma analogia. Quando você está em uma jornada de desenvolvimento de clientes ou produtos, está realizando uma investigação. Seu arquivo de evidência é como um arquivo de caso. Este arquivo pode conter fotos, frases ou qualquer outra coisa que ajude você a validar uma hipótese. Você precisa separar aqui as informações relevantes.

Tags: Nesta etapa você atribui categorias e padrões aos dados. Começa a dar significado. Essas tags ajudarão você a ver padrões em seus dados e a tirar conclusões. É a curadoria das informações. Gestão do conhecimento.

Histórias: A coisa mais importante sobre a criação de sentido é que ela ajuda a compartilhar significado, não dados. Os dados são importantes, mas emoção e empatia são o que compelem os outros a agir. O uso de analogias e metáforas são ferramentas que podem nos ajudar a transmitir ideias complexas as pessoas.

Geralmente nas entrevistas vamos em três pessoas. Um para fazer as perguntas e conduzir o processo. O outro para complementar as perguntas e identificar padrões na fala e um terceiro para tomar as notas. Utilizamos o Trello para separar os cartões em colunas e atribuir os tags as informações. Utilizamos o ciclo conforme descrito acima, e no próximo post vou detalhar um pouco mais sobre sensemaking antes de entrar no Metamodelo de Linguagem. Sobre um autor que gosto muito, o Christian Madsbjerg.

Sobre o autor

Rodrigo Zambon
Sólida experiência em Metodologias Ágeis e Engenharia de Software, com mais de 15 anos atuando como professor de Scrum e Kanban. No Governo do Estado do Espírito Santo, gerenciou uma variedade de projetos, tanto na área de TI, como em outros setores. Sou cientista de dados formado pela USP e atualmente estou profundamente envolvido na área de dados, desempenhando o papel de DPO (Data Protection Officer) no Governo.
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